« Je
ne suis pas d’accord avec ce que vous dites, mais je me battrai
jusqu’au bout pour que vous puissiez le dire »
Pseudo
citação atribuída a Voltaire
Por Felipe T Toniato
Quase
uma semana depois dos atentados à Charile
Hebdo
em Paris, muita tinta correu para tentar justificar os atos hediondos
perpetrados. Vivendo ha quase cinco anos na França e tendo
acompanhado de perto a repercussão, fiquei muito surpreendido com
tudo o que foi dito nos meios de comunicação brasileiros em geral.
Nenhuma das analises refletiram em absoluto todas as facetas do
evento. Enquanto que o “quando”,
o “onde”
e o “como”
eram óbvios e impassíveis de erros, muitos derraparam na tentativa
de explicar os “quem” e outros patinaram nos “porquês”. No
final, a impressão que temos é que não se entendeu coisa alguma e
no afã de ter de se posicionar, misturou-se alhos com bugalhos e o
resultado de
fait é
um qui pro quo imenso.
Valha-me Deus, Maomé e os profetas em querer ser o
dono da verdade, ou o Guardião da Divina sabedoria, entretanto me
sinto no direito, senão no dever de escrever eu mesmo algumas linhas
na tentativa de elucidar este imbróglio transatlântico; dito isso,
entremos em pormenores.
Qui
l'accusé Charlie Hebdo se présente au tribunal!
Quem é Charlie? E o que fez de grave para merecer uma
tão severa punição? Como eu disse a um grande amigo meu: “Charlie
Hebdo é punk”! Charlie Hebdo é o jornal que não poderia existir
em um Brasil gourmet. Charlie Hebdo a criança que desenha um pênis
na lousa enquanto a professora não esta, Charlie Hebdo é o cara que
grita: “toca Raul” no show do Joao Gilberto, Charlie Hebdo é a
mosca na sopa, Charlie Hebdo é aquele que desagrada Gregos e
Troianos, Charlie Hebdo é o cara que vai com a camisa da Gaviões no
desfile da Mancha-Verde e vice-versa, Charlie Hebdo é aquela que vai
de minissaia em enterro, Charlie Hebdo é aquele que prefere ver o
filme do Pelé, Charlie Hebdo é o jornal que ousou fazer uma
caricatura do profeta Maomé, quando esta é proibida segundo a lei
islâmica, e pagou por isso. E se você acha que todos os precedentes
estão errados em suas posições e merecem a punição que vier,
desculpe o meu francês mas você é jihadista!
Extremos
extremistas anti-extremismo. Esta seria a definição ideal para as
pessoas que trabalhavam, e trabalham ainda em Charlie Hebdo.
Criticar, criticar e criticar toda e qualquer forma de radicalismo
era o modus operandi deste semanário que, até segundos antes do
primeiro coup-de-feu,
era um dos menos lidos e mais odiados jornais franceses. Sim, Charlie
Hebdo nunca foi e nunca sera “popular”, e por quê? Porque ler
Charlie Hebdo da nó
no estomago, não é para os fracos. Não é a Folha Teen ou Casa e
Decoração. Charlie Hedbo choca para abrir os olhos na base da
porrada. Charlie Hebdo acusa. Todavia, nem sempre queremos ouvir que
estamos errados, ou que as nossas convicções são apenas isso:
convicções. Baseadas em crenças pessoais e relegadas ao grupo de
pessoas que dividem essas mesmas crenças. Para Charlie Hebdo não
existem formas universais, imutáveis e intocáveis. Somente existe o
direito de se expressar livremente, seja a favor ou contra, e mesmo a
favor ou contra o próprio Charlie Hedbo. Faça
o que tu queres pois é tudo da lei.
O indivíduo
deve(ria) ser autocritico o suficiente para entender que uma
caricatura é apenas um conjunto de traços em uma folha branca,
visando a atingir um determinado grupo de indivíduos que, não sendo
eles mesmos autocríticos, julgam-se acima do Bem e do Mal e
responsáveis pelo policiamento da Fé, da Moral e dos Bons costumes.
Categoricamente,
Charlie Hebdo não é contra o muçulmano, mas contra a religiosidade
cega. Nisso, muitas analises no Brasil ou erraram, ou não souberam
explicar. De toda maneira esta ai, quem quiser concorde, quem quiser
não concorde. E je
vous en
merde
!
Continua...